terça-feira, outubro 31, 2006

Não mais! (Súbito expressivo)




Por vezes, há frases que nos tocam com a sua beleza. A forma como tão suncintamente expressam um sentimento, um momento... seja o que for. Essas frases são normalmente utilizadas quer no plágio mais dissimulado ou na mais respeitosa citação.
Porém, não foi com uma frase dessas que fui brindado enquanto folheava um qualquer livro que lia na altura. Pelo contrário, encontrei um derrotismo em estado puro que já não encontrava há muito. Não referirei o nome do autor da frase, não desejo criticar a pessoa, per se, mas sim a frase que me deixou algo (senão bastante) alarmado.
"Já não é possível escrever poesia desde Auschwitz"
Esta frase deixou-me num estado enraivecido (tanto que desisti de continuar a ler o livro). Assustava-me a forma como tão reverentemente era citada.
Como podem haver pessoas que concordam com semelhante afirmação?
Não desejo de forma alguma ignorar, muito menos justificar, os terríveis actos que marcaram esse momento tão escuro da história humana, que foi o presenciado nos campos de concentração nazis. Nem da mesma forma quero denegrir a importância que a sociedade judaica tem dado à preservação da memória destes actos. É sem dúvida necessário lembrar os erros passados para que estes não se possam repetir. Especialmente um erro tão abominável como esse que foi o Holocausto.
No entanto, também acho necessário lembrar que não se pode desistir. Ser derrotado pelo pior do homem é negar que o seu melhor o suplanta. Aceitaremos que estamos condenados a uma vida de malícia com pequenos laivos de doçura?
Eu digo não. A frase em si é presunçosa o suficiente para me deixar zangado, mas a ideia que na realidade muitas pessoas corroboram com este ponto de vista faz-me levar as mãos à cara.
Sei que nunca chegarei a compreender completamente os horrores feitos em tais campos de chacina, e nunca entenderei o que é ser alvo do ódio e desprezo das massas apenas pela minha escolha religiosa.
Mesmo assim, o ódio das massas, como podemos notar, é vasto e multifacetado o suficiente para odiar tantos grupos, pessoas, crenças, atitudes e valores. Por isso mesmo, será que devemos continuar a considerar o caso judaico como especial?
A meu ver, as capacidades que esse povo de Israel (geográfico ou não) provou e ainda hoje prova, são razão o suficiente para merecer o meu respeito. Penso ainda, que a criação de um caso especial para os judeus, como quem penitentemente "pede desculpa", é mais uma forma de desrespeito do que qualquer outra coisa. A vitimização nunca, a meu ver, enobreceu fosse quem fosse.
E no entanto continuamos numa atitude hipócrita face a séculos de injustiça e perseguição. Por um lado agimos como se nada tivesse acontecido; muitos deixam passar a sua vida sem nunca se lembrar que de facto, em nós corre o sangue dos culpados e das vítimas. Por outro lado, numa atitude de "mea culpa, mea culpa, mea maxima culpa" (mais católica do que qualquer outra coisa) todos os anos recordamos esse abominável pedaço da história... pese embora o facto que no dia a seguir estamos mais preocupados em apanhar o transporte do que em recordar aquilo que devemos assegurar que nunca se repita.
Então que devemos fazer?
Tomar a frase como exemplo a frase e assegurar-nos que a poesia "já não é possível" como que em penitência ou solene recordação das terríveis acções do passado?
Não, digo eu!
A história do homem é povoada pelos actos mais horrendos como que testemunho do quão longe estamos da perfeição. No entanto, e isto é vital, nunca por um segundo parámos de fazer poesia. Nunca parámos de descobrir o belo que há dentro de nós (apesar do belo ser discutível, mas deixemos isso para outra altura) por muito horrendo que seja o contexto. Terá Shakespeare perdido a centelha que o incitava a escrever, ou porventura Pessoa viu demasiado fel para que Caeiro pudesse ensinar-lhe a beleza na simplicidade das coisas?
Não, mais uma vez!
A poesia subsistirá porque ela é (perdoem o romantismo adjacente) a flor que nasce em qualquer terreno por mais sujo que seja.
Já duas gerações passaram desde tais horrores e que vemos nós? Pelo mundo os movimentos de extrema direita ganham um poder imenso, enquanto que nas escolas, em pleno céu aberto, crianças demasiado novas para serem tão condenáveis praticam os piores actos de xenofobia e racismo.
Onde teremos errado?
Porque parece estarmos mais perto do que nunca de uma repetição das barbáries sucedidas?
Num mundo onde reina o medo e um terrorismo com demasiados nomes e culpados; onde as desigualdades são cada vez mais sentidas; onde aquilo, que tantos séculos levou a ser construído e preservado, é agora posto em causa pelas mesmas pessoas que se esforçaram para o erger; onde, um dia, o conceito de privacidade não será mais do que uma memória; onde as novas gerações não prometem mais do que uma medíocre continuação do estado das coisas. Neste mundo, neste hoje (tão mais presente do que qualquer campo de concentração), onde faltou lembrar os nossos erros, onde faltou lembrar os horrores passados?
Não faltou tal coisa. Seguramente não faltou essa lembrança... nunca me faltou a mim pelo menos.
O que faltou, penso eu, foi lembrarmo-nos que Auschwitz já passou. Lembrar que hoje é diferente de ontem. Lembrar que um milénio nos separa desses actos. Temos um milénio novinho em folha e não devemos gastá-lo com tristes fotografias e nostalgias do que já passou. Nunca nos faltou olharmos para trás... mas por alguma razão parámos de olhar para a frente.Por alguma razão esquecemos como escrever poesia.
Ou pelo menos desistimos de o tentar fazer.
Mas eu recuso-me a deixar a situação assim. Recuso-me a ser mais um Pilatos que depois de lavar as mãos recusa-se a vê-las sujas mais uma vez que seja. Cavarei esta terra, as minhas unhas negras e partidas, sangrarei mesmo! Mas não desistirei de tentar mostrar que o passado não é mais do que isso. Recuso-me a pensar que aqueles que sobreviveram a esses campos de morte quereriam passar o resto das suas vidas na memória desse inferno a que escaparam, como quem, depois de ser torturado, continua a sonhar com essa mesma tortura.
Auschwitz acabou, é passado, deve ser lembrado como aquilo que já não é e não aquilo que continua a ser. Muitos dirão que, desse modo, acabaremos uma vez mais por esquecer o que nunca devia ser repetido. Muito sinceramente, não me preocupo com o que possa advir dessas acções. Certamente não somos tão frágeis que não sobrevivamos a mais um erro... afinal de contas, sobrevivemos a Auschwitz. Ainda somos humanos, espero.
"Já não é possível escrever poesia depois de Auschwitz."
Nunca! Agora mais do que tudo, é preciso poesia, é preciso encontrar o pedaço de nós que resiste às nossas piores atrocidades.
A poesia subsiste, não o mal (seja lá o que for).
Esse agora é apenas cinza e terra, para uma flor despontar.



sábado, outubro 21, 2006

Quase elegia (Petite chanson pour un été passé)



Já caídas estão as primeiras folhas; memórias apenas de uma verdura que antes quase chegava a cegar. Os céus cobriram-se no mais sinistro dos tecidos e o sol perdeu a coragem de vir à rua por demasiado tempo. A lua... essa, branca e subtil, desfruta dos prazeres de uma noite cada vez mais longa.
Era Verão ainda ontem.
Lembro-me... um cheiro a resina no ar e vespas fervilhando entre a relva. Era Verão... que lhe aconteceu? Que aconteceu aos corpos apenas vestidos de água e sal? Que aconteceu a esses dias que de tão longos até aborreciam... cansavam mesmo?
Era Verão... lembro-me.
Chove... mas não me molho. Desde quando trago um chapéu de chuva comigo? Pesado, o ar sufoca neste mar de gotas e fumos... tenta tossir mas não quer.
O sol cai mais uma vez... já?
Escurecidos, os céus escolhem um tom mais escuro para acomodar essas pequenas chamas que apenas dão luz (que já de si é pouca). A lua brilha... como ela gosta de brilhar, olhem para aquele sorriso rasgado.
Frio... deste já me tinha esquecido, admito. Mas não gela o suficiente... não sei o que sentir; arrepios ou suores. Suponho que ainda não seja Inverno. Então porque não é Verão?
Esta estação não existe.
Mais folhas caiem como que querendo esconder o corpo putrefacto de suas irmãs. Amanhã vai chover, avisaram-me.
Sono... que horas são? Ah... nem me dei conta.
De uma parede fria de vidro vejo o rio... será que ainda há peixes nele?
Não sei que dia é amanhã... mas, para Abril penso que ainda falta um pouco.

...

Boa noite?

quinta-feira, outubro 05, 2006

Purgatório. (Burlesco)

"Tenha a bondade de me auxiliar!!!"
Ah... este grito. Como me fere... como me custa ouvi-lo a aproximar-se. Passo a passo, o som da sua voz ecoa não se deixando apagar pelos gritos metálicos do metro em direcção a uma qualquer estação que já me esqueci o nome (não importa, não é nesta que eu posso sair).
"Tenha a bondade de me auxiliar!!!"
Cada vez mais próximo. De cadeira em cadeira abana a garrafa de água cortada ao meio, deixando chocalhar as poucas moedas que até agora conseguiu acumular. A sua cuidadosa vara emite um estranho ritmo desconcertante enquanto o pobre tenta não cair na escuridão que é a sua vida.
"Tenha a bondade de me auxiliar!!!"
Está ao meu lado.
Eu não quero olhar!!
Não me façam olhar!
Por favor por favor por favor por favor por favor... não!!
No entanto ergo os olhos e... MEU DEUS!!
OS OLHOS!!
Não há olhos! As pálpebras estão unidas numa macabra cicatriz de carne deformada, tapando onde deveriam estar as orbes que tão romanticamente chamamos "os espelhos da alma". Que tipo de alma será aquela que não tem espelho? Presa numa escuridão da qual não pode sair... que efeito terá isso numa alma?
"Tenha a bondade de me auxiliar!!!"
Paraliso num êxtase aterrorizado e sou incapaz de esconder na minha cara a pena, tão obviamente traçada nos meus lábios, que sinto por ele. E secretamente solto um repugnante suspiro de alívio por ele não a conseguir ver.
Em menos de dois segundos o ceguinho volta ao seu desequilibrado percurso a sua vara à frente anunciando qualquer obstáculo. Só aí recupero consciência e apercebo-me que nem sequer lhe dei nada. E que lhe podia eu dar? Luz? Um apoio? Uns olhos?? Não... uma esmola, que mais lhe posso eu dar? Que outra coisa lhe posso dar senão este placebo? Ou será que a panaceia é para mim... que não tenho a vontade de o ajudar realmente?
"Tenha a bondade de me auxiliar!!!"
Alguns dão-lhe a esmola tão desesperadamente desejada, mas nunca levantam a cabeça. Tudo menos isso! Atiram a moeda de valor que nem eles próprios sabem esperando que isso o afaste... esperando que não tenham que ver aquela cara, aquela... alma coberta.
Já passaram três estações; a próxima é a minha. Mal as portas deslizam já me levantei e saí, um sentimento de náusea e ódio por mim contamina-me.
"Tenha a bondade de me auxiliar!!!"
Oiço a frase repetida como um mantra uma última vez antes das portas fecharem. O metro continua o seu percurso mas sem mim. No entanto ainda não posso sair deste subterrâneo dantesco. Ainda tenho que mudar de linha... o meu destino, Baixa-Chiado, ainda está a cinco estações de distância. A náusea persiste...
Ainda me espera um curto percurso, tornado maior pela azáfama da multidão que se movimenta comigo, cada indivíduo tentando não embater nos outros. Todos começam a subir nas escadas rolantes já a abarrotar. Já esquecidas estão as palavras do artista: "havia dois caminhos... e eu segui o menos percorrido". Só há um caminho... e neste momento está bem ocupado.
O metro chega à estação as portas abrem-se deixando passar as pessoas que se entalam tentando apanhar os lugares que ainda estão livres. Por sorte arranjo um assento... ao menos não será uma viagem cansativa.
Uma mulher dos seus cinquenta anos ocupa o lugar á minha frente. Na sua cara, está estampada um ar que, mesmo sem o reconhecer, me perturba. É aí que reconheço a expressão, os olhos pesados dirigidos ao chão, as mãos apertadas uma contra a outra como que lutando entre si... é vergonha esta expressão.
Mas porquê?
Como que respondendo, a mulher esforçadamente retira um papel da sua mala. Nele lê-se:
"Estou muito doente e já não tenho dinheiro para pagar as minhas receitas. Por favor ajude."
Um nó prende a minha garaganta... como é possível? As roupas... aí finalmente noto que apesar de mais caras do que as dos outros pedintes, estão amarrotadas, com um ar de não serem lavadas há pelo menos uma semana. A mala, uma óbvia imitação, também ela já sofreu o desgaste do tempo, a pele falsa manchada. Quando começa a levantar-se, uma tosse estérica possui de súbito a mulher revelando a doença que a afecta.
Os seus olhos lenta e dolorosamente erguem-se acabando por se encontrar com os meus. Um embaraço e dor tremenda escondem-se por trás da sua face. Os seus lábios mudos movem-se tentando desenhar as palavras cuja voz se recusa a dizer:
"Por favor..."
Que tipo de pessoa será ela? Que vida será a sua? Que doença lhe rouba o orgulho do qual apenas resta o suficiente para ainda recusar pedir de voz alta? A pobreza nota-se nas mãos que ainda têm a marca dos aneis que já terá penhorado... mas ainda não a ocupou totalmente. Ainda não está a passar fome... ainda faltam uns dias, umas semanas, quem sabe. Mas quando isso acontecer, até mesmo a voz terá de regressar.
Dou-lhe quase todas as moedas que tenho comigo, escavando na minha carteira qualquer vestígio de trocos. Ponho-os todos na sua mão e ela olha para mim com um olhar surpreendido. Pára por uns segundos e toma a decisão de voltar a sentar-se... parece que ficará satisfeita com o que lhe dei por enquanto. Esconde o papel na sua carteira, um olhar de alívio na sua cara por ainda ninguém o ter visto.
Os seu olhos capturam os meus, preenchidos por uma gratidão coberta de extrema vergonha. Um sorriso que já não consegue evitar começa a esboçar-se. Quase suspirado, sai da sua voz um quase choro:
"Obrigado... muito muito obrigado."
Não... tudo menos isso!! Por favor não olhe para mim assim!! Não tenha vergonha! Não me faça isso!!! MAGOA-ME... não vê o quanto me dói vê-la assim??
Passadas duas estações a mulher levanta-se e lança-me um último olhar antes de sair. Retomado o andamento do transporte, um estranho peso levanta-se do meu peito... mas, a náusea persiste.
Subitamente, do rúido eléctrico dos carris, um pranto ergue-se bruto e magoado.
"Por favor! Uma esmolinha... tenho tanta fome!"
Olho para trás e uma mulher, esta já devorada pela pobreza, agarrada a uma canadiana tentando não pousar o pé direito, inchado e vermelho, quase que se prostra pedindo a caridade dos passageiros. A dor é óbvia na sua cara mas a vergonha... essa já não existe. O orgulho é um peso no estômago para quem não consegue pagar as suas próprias refeições. Não... esta já se habituou. Esta já cuspiu na sua cara. Esta tem fome.
"Uma esmolinha por piedade! Já não como há tanto tempo..."
Como que cobertas por uma carapaça, as pessoas nem sequer cruzam o olhar com a face desesperada. A mulher aproxima-se lentamente de mim... um solavanco desequilibra a pobre, já em dificuldade de andar com uma canadiana. Cai contra um dos passageiros que a ajuda a levantar-se... um ar de desdém e frete ocupa-o enquanto passa a mão pelo casaco do fato de negócios que usa como uma aramadura contra as ameaças que já se apoderaram da mulher aleijada.
Não quero ser outro desses!!!
Está cada vez mais próxima.
"Uma esmolinha... por favor!"
Lembro-me que já não tenho nenhuma moeda comigo. Tenho de evitá-la... não posso fazer face àquela mão desesperada sem lhe dar nada.
Não quero... não quero... não quero... NÃO QUERO!!!
O metro pára... é a minha estação! Levanto-me e avanço para a saída tentando evitar a mulher e os seus olhos. Consigo e assim que as portas se fecham sinto que escapei um terrível destino. Mas aí apercebo-me... a verdade... essa cruel cicuta que tenho que beber... é que eu sou um desses! Também eu não a quis ver... também eu a evitei.
A náusea persiste...
Preciso de sair!
Quero sair!
Não há céu neste sítio... nem brisa... nem espaço!
Preciso de sair!
Quase a correr aproximo-me da saída.
Inserir Cartão... Passagem Livre.
Começo a correr. Não me importa quem olhe... normalmente esforçam-se por não olhar uns para os outros com medo que os seus olhares se cruzem.
Corro até às escadas... são longas e demoradas. Evito as escadas rolantes demasiado ocupadas e escolho as normais quase desocupadas (eis o "caminho menos percorrido"). De dois em dois degraus quase salto enquanto um forte vento frio anuncia-me a saída.
Não presto atenção à criança esfarrapada e suja que, com a sua doce e ingénua voz de quem não
entende totalmente porque precisa de fazer o que faz, cativa os outros passageiros. Não posso prestar atenção... já não posso.
Desculpem-me... não posso mesmo.
A saída em fim... saio!
LUZ!!!!
AR!!!
CÉU!!!



...
..
.
Mas, a náusea persiste.

quinta-feira, setembro 07, 2006

Of bowing (galante)



Let us consider for a moment that gallant of movements… bowing. I stop before you, standing in that position which only man has above all animals, our eyes meet and we’re at the same level. Only then, strangely enough, I curve my back bringing my head down and I stop there, bringing my arm to my chest and looking straight at the ground… our eyes no longer meet, we are no longer at the same level.
Bowing is one movement that exists in most of the known cultures in our world (again I say, I will not say all the cultures because I will not have the presumption to say I know them all… although I have the ambition) but it has slowly grown more and more out of use. In older times, those much before my own, bowing was a very common gesture to be had with many different meanings. Brief greeting, courtship, show of respect, act of thanks, proof of humility… so many meanings and yet so many have fallen to waste. So rare nowadays to see someone bow...
In the occident, very few people still bow to one another. Perhaps it was the effect of change in our society. Are we so afraid of putting ourselves below someone that we refuse to ever bow?
In these days, I have to say I know only one type of person that will bow with some regularity: an artist. You hear the clapping, you end your performance, you reveal your heart and art… and you bow. Why would people who show such greatness, such beauty be the ones to bow before an audience? Do we consider so little of ourselves?
The way I see it, is perhaps a different one. Bowing is, indeed, putting yourself below a person; lowering you head to show your humility or your thanks. But even so it is not a way to show your inferiority… much the contrary actually. The way I see it, it’s all matter of where you’re seeing it. In a place where the heavens would be your standing ground and the earth would be the far away firmament, bowing would be putting yourself above the one you bow to.
An artist shows humility when he bows… humility is a great virtue, one that few people have. To achieve greatness, to create beauty and art and yet be humble… it is a very enlightened thing to do.
It is true that when I bow I’m no longer at your level… but which level is that? Is it a lower level because I’m closer to the ground, or is it a higher level because I have given proof of my humility… because I do not feel ashamed to put myself below you?
I have referred in a previous text that although clapping one’s hands is a sign of humility but that, even so, bowing is infinitely more embarrassing. Indeed that is true… but to whom is it more embarrassing… he who bows or he who is bowed to?
If I should bow to you… would you not feel embarrassed? How to react to such a thing? It is such an unusual thing to do. I just stay like that… saying nothing, as if waiting for you to do something. So what should you do?
There is only one thing you can do, I believe. There is only one way for us to be again at the same level, be it a lower or a higher one: you must bow as well.
Strange isn’t it? You bow to show humility and yet what you’re doing is also a challenge to the other person. The true meaning of a bow is in fact to challenge one’s humility. It challenges the one who bows first because of the awkward situation it results in but it also challenges the one who is bowed too because that same person must show his own humility as not to seem arrogant.
I feel sorry for the way that bowing has fallen out of use. Romantic and perhaps over-poetic as it may be… my idea of bowing is based on the hope that there still is some humility left in the world. That there still exists the chance for us to understand that all our achievements, grand as they may be, do not erase our own limits, do not ease the burden of our own insignificance.
There will always be the need to bow before one and all… because, in the end, when you bow, you will always be bowing before yourself. You will forever need to bow before the image that you have of yourself beacause that image will always be superior to yourself.
But, the beauty in it is that when you bow to yourself you are showing your superiority. When you bow to yourself, to that image you have of yourself, you’re forcing it to bow to you. Therefore your limits will always be a reflection of your achievements.
I bow before myself knowing that I’m accepting my limits not as obstacles but as lines that will guide me to push myself forwards.
I bow before you hoping that you will do the same and in doing so we’ll be equals as humans with the same ambitions and yet the same humility.
I bow before humanity… and yet… I’m not sure that it will bow back to me…
Thank you.

Dedicated to
The one I shall never be ashamed to bow to.



PS- For this time I have chosen english as my medium because I wanted to reached a more varied audience. Although I will still be writing in Portuguese, some of my posts will form now on be also written in English. I hope this does not displease my more usual readers (if I should have any).

quinta-feira, agosto 24, 2006

Ressonâncias (breve allegro por tudo e por nada)



Ressoa!
Sinto em mim uma força que pulsa e soa. Um som que sempre esteve dentro de mim mas que só agora decido escutar.
O que é este som?
Porque o oiço?
Não o ouvem também?
Todos o ouvimos. Fechamos os olhos e concentramo-nos... e não importa o que nos rodeia mas o som aparece. Brotando de nós e por nós... primeiro como uma fonte escondida, num lugar em que tudo é verde e fresco; depois cresce e já não é fonte... é rio, é lago, é mar, é oceano, é terra, é tudo.. sou eu! Enconto-me nesse som que ecoa nas minhas veias... sorriu... oiço esse som tão claramente em mim.
Não sei o que esse som é. Ou melhor, sei mas não consigo explicar a mim próprio. Sempre o soube mas nunca o entenderei... escutarei mas duvido que sequer venha a perceber. Mas não preciso de o compreender para o ouvir.. para o sentir.
É o som que murmura no meu coração, na minha pulsação... é loucura... é uma complicação, tão simples no fundo, que até fico aborrecido por me preocupar com tal coisa (mas também senão me preocupasse nem valeria a pena ter ouvidos). É estar vivo. É saber que vivo e que oiço e ressoo. É saber que me foi dada a chance de fazer eu próprio o meu som... grito a plenos pulmões e quebro o estático silêncio dos planaltos sem vida. Que pode um deserto contra a vida... um mar contra a vida... a morte contra a vida?
Oiçam-me!
Deixem-me ressoar e nestas ressonâncias vos mostrar a minha mensagem... mensagem que não é mais do que uma cacofonia sem nexo mas que tem de ser escutada. Oiçam este som e descubram (ou melhor... apercebam-se) que também têm um som igual (mas diferente) a pulsar dentro dos corpos que são os vossos instrumentos.
Sejamos intérpretes desta melodia tão breve a que chamamos a nossa existência.
A vida é música... quebra o silêncio frio das eternidades habitadas por nada. Somos música... cada célula canta. Contra a corrente do tempo que impõe a insubstancial perfeição de cristal, impomos o nosso andamento, a nossa melodia.
Não desistir... não parar... cantar e fazer-nos ouvir. Nem uma montanha durará tanto tempo como a nossa música.
Enlouqueço e canto!
Enlouqueço e escrevo!
Enlouqueço... e enloqueço os outros...
Que seja este som que eu oiço o eterno pulsar da vida que tantas formas tem como sons. Partilho esta sinfonia com todos... mas a minha melodia só eu a sei. E por isso a guardo para poder escutá-la quando quero.
Cantemos... o silêncio é assustador e a noite sua conselheira.
Cantemos... só nos resta isso.
E isso é tudo.
Ressonâncias... tudo ressonâncias...

domingo, julho 16, 2006

Aplausos (ovação inspirada)

Oiçam...
...
O som incessante...
...
A vaga bruta e desorganizada...
...
Oiçam-nos... os aplausos.
Este som tão primordial... uma das marcas mais antigas de quase todas as civilizações humanas (digo "quase" porque não terei a presunção de dizer que as conheço a todas). Desde que o homem teve razão para louvar, aplaudiu.
É tão simples! Duas mãos; um contra a outra repetidamente... e cria-se a moeda corrente mais utilizada no mundo dos elogios.
E no entanto, por trás dessa simplicidade esconde-se um siginificado quase poético (tal como em todas as facetas humanas). Uma das ocasiões em que se costuma ouvir mais aplausos é num espectáculo... lembro-me como foi aplaudido Yo-Yo Ma quando tocou em Portugal... lembro-me como eu aplaudi até as minhas mãos ficarem vermelhas. Era como se as mãos tivessem vontade própria... como se elas ficassem vermelhas de vergonha perante a grandiosidade das mãos que há poucos segundos tinham tocado a sexta suite de Bach.
Que são os aplausos senão mãos a aplaudir mãos?
Que são o aplausos senão o reconhecimento da nossa insignificância perante o que nos supera mesmo que seja só num momento?
As mãos são sem dúvida a maior ferramenta do homem... as nossas civilizações têm a distinta marca da mão humana, como uma impressão digital: única e inconfundível. Usámos as mão para criar, destruir, matar, acariciar, amar, odiar, superar... também as usamos para elogiar. Também as usamos como gesto de humildade.
Nós, portugueses, somos conhecidos pelos artistas do resto do mundo como o povo mais generoso em termos de aplausos. Bom, mau, medíocre... após qualquer espectáculo nem precisamos de esperar um minuto para que o público inteiro esteja de pé a louvar o artista como um semi-deus.
Será falta de gosto?
Eu gosto de pensar de outra maneira. Gosto de acreditar que é uma prova do quão conscientes da nossa condição estamos. Aprecio a ideia que os Portugueses perante a grandeza de certos indivíduos ou talvez perante a sua própria insignificância se sintam compelidos a aplaudir... fazer uma vénia é mais complicado e infinitamente mais humilhante.
Talvez precisemos de ser mais aplaudidos... ou alguns precisem de aplaudir mais vezes. Talvez precisemos de entender melhor a importância dos nossos aplausos... uma ovação hipócrita é tão insultuosa como uma ovação sentida o é enaltecedora.
Talvez um dia possamos escutar por todo o mundo esse som tão belo e simples...
Talvez as multidões um dia aprendam a aplaudir-se a si e aos outros sem diferenças...
Talvez...
Ah... mas volto a ouvi-los..
Incessantes...
Os aplausos...
Oiçam-nos...
...
..
.

sábado, julho 08, 2006

Livros (avec une grace calligraphiée)




Em livros me perco.
E com tantos livros me ocupo a ler... que me esqueço de escrever.

Por isso, como um filho pródigo, regressa este bloguista algo preguiçoso ao seu blog que parece andar mais lento que "la plus que lente" (que, diga-se de passagem, até para Adagio é um exagero).
Falemos então de livros, esses objectos, exóticos para alguns, que acompanham a nossa civilização desde que esta desejou ser imortal.
Não falarei do que está escrito... deixarei isso para outra altura ou outro post. Gostava, hoje, de falar apenas sobre os livros, o objecto, o papel, a sua importância... pelo menos aquela que eu penso que têm.
Sempre me transmitiram uma estranha sensação de eternidade, os livros. Apesar de, segundo me disseram, a esperança média de vida do papel de um livro ser pouco mais que 100 anos, sempre vi os livros como pensamentos capturados no papel para não mais se perderem; pequenas pedaços de uma alma convertidos em eternidade.
Casa ou prisão das palavras, os livros sempre ocuparam uma pequena totalidade da minha vida e da minha mente. Quer sejam frívolos romances, pesados ensaios, grossos manuais, bucólicos poemas... livros são e por isso permanecem, eles e as suas palavras.
E também devo aqui confessar que, para mim, os livros são também uma forma de puro narcisismo intelectual. Nos livros o ser humano projecta as suas palavras para além da sua voz... sempre serão mais os leitores do que os ouvintes. Nos livros, o homem permanece mesmo que o seu corpo se dissipe na triste alquimia da vida e da morte... a palavras sempre tiveram uma maior capacidade de preservação do que a carne. E também nos livros, o homem pode esconder os seus mais preciosos sonhos e ideias da corrente do esquecimento a que nós todos estamos condenados.
Como pequenas pedras que vão ao fundo e não se deixam levar pela fluidez das águas do tempo... os livros são coisas deveras extraordinárias. Por isso os amo e por isso não posso evitar uma certa poesia (algo exagerada, devo admitir) quando me refiro a eles.
Outra coisa que me espanta nos livros é a sua capacidade de reprodução: quando se escreve um livro, este se converte numa criatura dotada de um tipo especial de vida e , logo, de um tipo especial de instinto de sobrevivência. Muitos são os livros que depois de serem lidos resultam em mais livros (o que leva à questão milenar: Ecritor ou leitor... o que veio primeiro?). Outros, não querendo permanecer limitados pelo vernáculo se traduzem e se espalham pelos quatro cantos (e tantas línguas) do mundo. Alguns até chegam a ser escritos mais do que uma vez de forma a conservar as palavras... reeditam-se, logo, permanecem (se um livro vive 100 anos quantos anos vivem 10 ou 20 livros?).
E no entanto... é tão fácil queimar papel. Reduzir a glória de uma Ilíada a cinzas demora muito menos tempo do que levou a que fosse escrita. Com tanta facilidade se rasga um livro... com tanta facilidade se rasga um pequeno pedaço de história ou de alma. Custa por vezes pensar quanto se perdeu com cada livro que se extingue.
É neste estranho paradoxo de um livro que move mentes mas que se reduz a um simples combustível que se encontra, para mim, uma das mais belas facetas de um livro: a sua humanidade. Tão frágil e extraordinário... um livro é em grande parte como o seu escritor que por muito valor que tenha se reduz à sua condição... facilmente perecível. Afinal de contas, o homem fez o livro, não necessariamente à sua imagem mas, pelo menos, à sua letra.
Ah! Mas já me perco!
Deixo-me de escritas por agora. Regresso ao sadio (e, por vezes, nem tanto) hábito de leitura pois, se continuasse a escrever... que livro isto daria.